Guia para Regularização de Agroindústrias da Agricultura Familiar Agroecológica
Ano 2021
Parceiros realizadores

Capítulo 03

Regularização Sanitária

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A regularização sanitária costuma ser a etapa mais complexa do processo de regularização de uma unidade de beneficiamento e só pode ser realizada mediante a adequação aos procedimentos jurídicos, fiscais e ambientais.

De acordo com o Decreto-Lei nº 986/1969, que institui normas básicas sobre alimentos, os estabelecimentos onde são fabricados, preparados, beneficiados, acondicionados, transportados, vendidos ou depositados alimentos devem ser previamente licenciados pela autoridade sanitária competente municipal, estadual ou do Distrito Federal. Sendo assim, as etapas para regularização destes estabelecimentos são:

  1.  Licença Sanitária (Alvará Sanitário) para estabelecimentos enquadrados na competência de fiscalização da Anvisa ou Registro do estabelecimento (número de registro) para estabelecimentos enquadrados na competência de fiscalização do MAPA;
  2. Registro de cada produto (rotulagem), quando obrigatório, conforme definido em legislação de cada órgão competente (Anvisa ou MAPA);
  3. Elaboração e implantação das Boas Práticas de Fabricação (BPFs) e manuais de Procedimentos Operacionais (POPs ou PPHOs).

Importante verificar periodicamente as mudanças nas legislações. Recentemente, atualizações nas legislações, principalmente nas que tratam de empreendimentos de pequeno porte, foram feitas com o intuito de simplificar os procedimentos de regularização de pequenas empresas que desenvolvem atividades de baixo risco ou pertencem à categoria de Microempreendedor Individual (MEI).

A Lei de Liberdade Econômica nº 13.874/2019 facilita esse processo para os estabelecimentos e a Resolução CGSIM nº 59/2020 dispensa alvará para o MEI (Microempreendedor Individual), que deve concordar com o Termo de Ciência e Responsabilidade com Efeito de Dispensa de Alvará. Este documento é emitido digitalmente e permite o início imediato das atividades pelo MEI.

NESTE TERMO DE CIÊNCIA, O MEI IRÁ DECLARAR:

  • o conhecimento e atendimento dos requisitos legais exigidos pelo estado e pela prefeitura do município para a dispensa de Alvará de Licença e Funcionamento, compreendidos os aspectos sanitários, ambientais, tributários, de segurança pública, uso e ocupação do solo, atividades domiciliares e restrições ao uso de espaços públicos;
  • a autorização de inspeção e fiscalização no local de exercício das atividades, ainda que em sua residência, para fins de verificação do cumprimento dos requisitos;
  • o entendimento de que o não atendimento dos requisitos legais exigidos pelo estado e pela prefeitura resultará no cancelamento da dispensa de Alvará e Licença de Funcionamento.

Entretanto, a fiscalização será realizada posteriormente, de ofício ou como consequência de denúncia encaminhada à autoridade competente. Se for de interesse do produtor e processador, a solicitação dessa visita pode ser feita com o objetivo de adiantar o processo ou reforçar o que já foi encaminhado no momento da regularização jurídica do empreendimento. Quando o microempreendedor solicitar o Alvará Sanitário, o órgão deve emitir protocolo de solicitação com o prazo de sua análise e, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da Vigilância Sanitária implicará a aprovação do funcionamento legal do empreendimento, para todos os efeitos. São princípios de razoabilidade e proporcionalidade que a Lei de Liberdade Econômica defende, para que os menos favorecidos recebam tratamento simplificado e tenham progresso social e econômico.

CONTROLE SANITÁRIO E EMPODERAMENTO DAS COMUNIDADES

Em relação aos microrganismos que oferecem riscos à saúde das pessoas, merecem destaque as Doenças Transmitidas por Alimentos (DTAs), que podem originar surtos, morbidade e mortalidade. A RDC Anvisa nº 216/2004, alterada pela RDC n° 52/2014, dispõe sobre Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação e tem como objetivo estabelecer Boas Práticas para Serviços de Alimentação, a fim de garantir as condições higiênico-sanitárias do alimento preparado. Sendo assim, aborda riscos que os alimentos podem oferecer se apresentarem contaminantes de origem biológica, química, física ou radioativa, sendo uma resolução muito importante para a área.

As análises devem ser constantes para que o gerenciamento de riscos funcione com eficácia, principalmente nos empreendimentos familiares em que o método de produção é artesanal e a falta de conhecimento pode oferecer riscos de contaminação decorrente da manipulação incorreta do alimento. É de suma importância o conhecimento sobre o comportamento dos microrganismos, principalmente as bactérias, de acordo com as condições ambientais. Entre 5° e 60°C, por exemplo, muitas situações podem ocorrer no desenvolvimento de bactérias.

Mas não são apenas os riscos biológicos, causados pelos microrganismos, que exigem preocupação. Os riscos químicos também merecem destaque, principalmente o Limite Máximo de Resíduos (LMR) que determinado alimento pode apresentar e outros contaminantes químicos como residual de produtos de higienização e sanitização.

É preciso se preocupar, ainda, com os riscos físicos: a presença de qualquer material que não pertence ao beneficiamento do alimento, como, por exemplo, pedaços de madeira, pedras etc., que podem colocar em risco a saúde do consumidor por causar lesões.

Além destes cuidados com os processos de fabricação, existe a necessidade de informar ao consumidor as características do alimento de forma clara e confiável, incluindo no rótulo informações sobre os benefícios à saúde que aquele alimento oferece (como, por exemplo, a presença de ômegas 3, 6 e 9) Para isso, é fundamental estudar o produto que será comercializado e pesquisar sobre as suas propriedades benéficas (com comprovação científica).

Da mesma forma, é responsabilidade do produtor e processador esclarecer sobre possíveis efeitos negativos do alimento na saúde de quem o consome.

Importante sempre anotar no controle de entrada de ingredientes a origem destes para o devido rastreamento e responsabilidades, em caso de qualquer problema de saúde pública.
Produtos de origem animal oferecem grandes riscos de contaminação quando não existem condições sanitárias adequadas em toda a sua cadeia produtiva.

A legislação vigente no país pode colaborar muito no direcionamento dos empreendimentos familiares rurais. É o que se pode encontrar na Instrução Normativa MAPA nº 16/2015, que estabelece, em todo o território nacional, as normas específicas de inspeção e a fiscalização sanitária de produtos de origem animal, referentes às agroindústrias de pequeno porte.

Facilidades podem ser encontradas nessa normativa relacionadas às produções de leite, carne e ovos. No próprio site da Anvisa, quando a busca é direcionada para regularização de empresas da área de alimentos, existe toda a legislação necessária para adequar qualquer agroindústria com o objetivo de regularização através da Vigilância Sanitária do município. É evidente que os empreendimentos familiares rurais devem receber tratamento diferenciado e simplificado, baseado no princípio da razoabilidade encontrado na legislação, e o olhar do fiscal deve ser adaptado à realidade desses tipos de empreendimentos.

Grandes empresas oferecem riscos sanitários em maior escala se não seguirem as normas de Boas Práticas de Fabricação, podendo atingir um maior número de consumidores e maiores riscos de contaminação. A Lei de Liberdade Econômica surge nesse contexto: baseada nos princípios de razoabilidade e proporcionalidade, simplifica a regularização de microempresas e empreendimentos familiares que não representam ameaça em provocar grandes níveis de contaminação de alimentos. O Sebrae tem papel importante na orientação conjunta com as prefeituras em relação à abertura de MEIs para o desenvolvimento de atividades de processamento de alimentos.

A RDC Anvisa nº 49/2013 – que dispõe sobre a regularização para o exercício de atividade de interesse sanitário do Microempreendedor Individual, do empreendimento familiar rural e do empreendimento econômico solidário – estabelece justamente o tratamento simplificado e favorável aos microempreendimentos, promovendo a inclusão produtiva com segurança alimentar.

A RDC Anvisa nº 275/2002 – que dispõe sobre o regulamento técnico de Procedimentos Operacionais Padrão (POPs) aplicados aos estabelecimentos produtores/ industrializadores de alimentos e sobre a lista de verificação das Boas Práticas de Fabricação (BPFs) em estabelecimentos produtores/industrializadores de alimentos – orienta com detalhes como elaborar esses documentos tão importantes no controle dos perigos relacionados aos processos produtivos de uma agroindústria.

Uma experiência a ser compartilhada foi vivenciada pelos produtores do estado do Paraná, que utilizaram a RDC Anvisa nº 49/2013 para a elaboração de proposta da própria legislação sanitária do estado, para execução das Vigilâncias Sanitárias municipais, o que originou a Resolução SESA 004/2017, destinada ao Empreendimento Familiar Rural.

O planejamento consistiu no desenvolvimento de comitês construtivos que direcionaram as normas aceitas para reuniões e oficinas com as Regionais de Saúde. Após tudo pronto, a resolução retornou para as Regionais de Saúde para a aplicação de acordo com o princípio da razoabilidade, que defende a demonstração de todas as garantias que consolidam a segurança alimentar do estabelecimento, independentemente das características das instalações, materiais, ferramentas e utensílios. No site do Governo do Estado do Paraná, no espaço destinado à Secretaria de Saúde e relacionado à Agricultura Familiar, existem materiais didáticos essenciais para o direcionamento de qualquer empreendimento familiar rural ou equivalente à indústria de pequeno porte. O endereço é http://www.saude.pr.gov.br/modules/conteudo/ conteudo.php?conteudo=3228.

 

A necessidade de se ter informações sobre políticas, ações e serviços destinados ao controle sanitário de empreendimentos do ramo alimentício deve ser suprida pelas unidades do município, estado ou região ligadas ao Sistema Único de Saúde coordenado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e ao MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Já para informações sobre a abertura de empresa, o setor tributário das prefeituras, o Sebrae e os escritórios de Contabilidade podem auxiliar com orientações adequadas. Mesmo com a permissão imediata de funcionamento após registro da microempresa, a Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 (Lei de Liberdade Econômica) e a Resolução CGSIM nº 51, de 11 de Junho de 2019, não excluem a obrigação da fiscalização sanitária. De acordo com a VISA (Vigilância Sanitária) Estadual e Municipal, a qualquer momento o estabelecimento registrado (CPF ou CNPJ) poderá receber a visita do órgão de fiscalização sanitária, sendo que este deve atuar, inicialmente, de forma orientativa e depois como órgão fiscalizador, ou seja, a lei apenas simplifica o processo de regularização para as microempresas. Algumas normas podem ser distintas de acordo com a especificidade das diferentes prefeituras, desde que não sejam contrárias às normas federais. Quando não houver legislação específica para a atividade em questão no município, o que vale é a Legislação Estadual e Federal.

No caso de unidades de beneficiamento inseridas no contexto dos Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade (OPACs), os grupos de produtores orgânicos e integrantes desse sistema participativo devem fortalecer os mecanismos orientativos, principalmente através das visitas de pares. Organizações deste tipo, muitas vezes, contam com o suporte de técnicos que podem auxiliar na regularização de Unidades de Processamento. Nunca é demais lembrar a responsabilidade dos interessados em estudar a legislação, a antiga e a nova, inclusive a Legislação Orgânica, a Lei nº 10.831, de 2003 e seus dispositivos complementares. Essa Legislação de Orgânicos dispensa, por exemplo, a obrigação da dedetização com substâncias tóxicas, porém exige métodos físicos de controle de pragas. Com o estabelecimento regularizado, uma agroindústria já pode funcionar e a comercialização dos produtos dependerá da adequação das Boas Práticas de Fabricação dos alimentos, das embalagens e dos rótulos.

O beneficiador e a beneficiadora devem possuir todo o conhecimento possível sobre sua atividade, para que possam conversar com os agentes fiscalizadores, com o amparo da lei, tendo todas as normativas em mãos para comprovação sempre que necessário.

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